A Pérsia já presenciou a ascensão e queda de diversos impérios, cada um deles deixando para trás seu legado e sua marca no mundo. Como era de se esperar, uma nação milenar e que já abrigou inúmeras civilizações sem dúvidas deve ter os seus players, isto é, os grandes nomes que compõem a sua história.

Dentre esses nomes, podemos citar Nader Shah, fundador da dinastia Afshárida (ou Afexárida) e um dos governantes mais poderosos de toda a história da Pérsia, atual Irã.

Pela descrição acima, muitos poderiam pensar que Nader Shah teria nascido numa família nobre, provavelmente sucedendo o governo da Pérsia de seu próprio pai ou algum outro familiar próximo, ou quem sabe teria se aproximado do líder anterior devido ao seu elevado status social por conta de suas origens familiares e assim ter sido nomeado como sucessor de um já moribundo governante. Embora esse tenha sido o caso de alguns governantes ao longo da história, não é o que aconteceu com Nader Shah.

Nader Shah Afshar nasceu em uma família nômade [1], sendo uma criança muito aguardada pela sua família. Seu pai, Emam Qoli, na realidade, não era um governante ou um aristocrata, mas sim um pastor com seu rebanho.

Os Qereqlu Afshars a quem o pai de Nader pertencia eram uma tribo turcomana seminômade estabelecida em Khorasan, no nordeste da Pérsia. Nader nasceu em Dastgerd, uma vila fortificada no lado norte das montanhas Allahu Akbar da região de Darra Gaz, a noroeste de Mashhad, capital de Khorasan. Ao nascer, recebeu o nome de Nadr Qoli, que significa “escravo do maravilhoso”, uma forma de devotar piedosamente a criança ao serviço de Deus. Quando anos depois o filho de Emam Qoli se tornou Shah, ele mudou seu nome para Nader, que significa “Raridade” ou “Prodígio”, possivelmente um apelido que já possuía antes, pois ainda em fase de crescimento demonstrou certas habilidades incomuns.

Mesmo com dez anos de idade, dizia-se que Nader era um bom cavaleiro, caçador e habilidoso com o arco e a lança. Um de seus primeiros biógrafos, seguindo as convenções comuns à vida dos heróis na literatura persa, destacou sua precocidade, dizendo que quando Nader tinha somente um ano, parecia uma criança de três, sendo que aos dez, montado em seu cavalo, foi caçar leões, panteras e javalis. Outra história diz que quando ele brincava com outras crianças ele se intitulava rei e deixava os outros governarem partes menores de seu reino. Em uma ocasião ele fez esses demais governantes lutassem entre si e no final, se houvesse um vencedor, ele dava suas roupas para aquela criança vencedora e voltava para casa nu. Quando sua mãe o viu, ela se irritou, e ele correu para seu pai para escapar dela. Seu pai levou Nader para casa e disse à mãe para deixar a criança fazer o que quisesse.

O pai de Nader viria a falecer quando ele tinha somente 13 anos, o que levou a procurar uma forma de sustentar a si e sua mãe. Ele não tinha outra fonte de renda além dos gravetos que coletava na montanha e que transportava para vender no mercado local para serem utilizados como lenha. Os anos que se seguiram foram difíceis e foram significativos para a conduta simpática posterior de Nader em relação às mulheres, uma vez que ele viu sua mãe batalhando como uma viúva pobre, em uma sociedade em que uma mulher sem proteção masculina era altamente vulnerável. Desamparada e com dois filhos pequenos para criar, seria difícil casar de novo, e algumas nessas circunstâncias teriam se mudado para a cidade mais próxima e caído na prostituição por falta de outras opções. Não foi o caso da mãe de Nader.

Há ainda uma história de que Nader e sua mãe seriam levados como escravos, mas provavelmente é apenas um mito ao redor de sua imagem.

Com uma vida difícil, aos 15 anos ele se alistou como mosqueteiro para um líder tribal, subindo na hierarquia e se tornando o braço direito do mesmo. Este era Baba Ali Beg Kuse Ahmadlu, o governador da cidade de Abivard, um importante chefe entre os afshars de Khorasan. Provavelmente havia algum tipo de conexão entre Baba Ali e o pai de Nader. Nader começou como um mero mosqueteiro comum, mas como dito, tornou-se o braço direito de Baba Ali conforme galgava a postos mais elevados.

O dardo e o arco que ele aprendera a usar no vale de Darra Gaz ainda eram armas tradicionais importantes na vida tribal e na caça, mas mesmo no remoto nordeste da Pérsia, o primeiro já era obsoleto e o segundo acabou se tornando ultrapassado na guerra pela disseminação de armas de fogo de pólvora. Ao aprender a usar um mosquete de cano liso, Nader estava aprendendo o perigoso ofício da guerra moderna. A experiência ensinou-lhe o potencial relativamente inexplorado dessas armas, através das quais ele acabaria por revolucionar a prática da guerra na Pérsia e na região vizinha. Mas esses dias ainda estavam longe, pois Nader teria de trilhar uma longa jornada até chegar lá.

Como Nader deixou sua marca entre as tropas do governante de Abivard, sua principal responsabilidade teria sido perseguir invasores e recuperar seus saques, fossem propriedades móveis, animais ou seres humanos. Sem dúvida havia incerteza em muitos casos sobre o que pertencia a quem, e é provável que Nader tenha se beneficiado dessas áreas cinzentas. É fácil ver como, mais tarde, histórias hostis sobre ele ter sido um bandido e ladrão poderiam ter se originado. Por volta do ano 1714/1715, um ataque maior do que o normal por turcomanos da tribo Yomut invadiu o norte de Khorasan, com vários milhares de soldados. A força de fronteira de Baba Ali lutou contra os turcomanos com sucesso, os derrotou e capturou 1.400 dos invasores. Nader deve ter se destacado na luta, porque Baba Ali o escolheu para levar a notícia da vitória ao shah(xá) na capital, Isfahan. Em Isfahan Nader foi apresentado ao Shah e sultão Husayn e recompensado com um presente de 100 tomans, moeda persa.

Quais foram as impressões de Nader sobre a corte safávida? Sabemos por incidentes posteriores que Nader era impaciente com a pompa e a sofisticação da corte. Por mais superiores e condescendentes que os oficiais da corte pudessem ter sido com ele, o mesmo desdenhava a vã ostentação, a mesquinhez, a preguiça e a hesitação de seu círculo. Ele sempre preferiu a austeridade no vestuário e na conduta. Parte disso era característica pessoal de Nader, mas havia um aspecto mais profundo e culturalmente ressonante nesse “confronto” entre o guerreiro provinciano e os protocolos da corte.

Nessa época, o Império Safávida já era decadente e estava prestes a ruir, marcando o final de seu domínio que vinha desde 1502. No auge, sob figuras como Abbas, o Grande, o Irã safávida era um império poderoso, mas no início do século XVIII o estado estava em sério declínio e o shah, o sultão Husayn, era um governante fraco. Quando o sultão tentou reprimir uma rebelião dos Ghilzai afegãos em Kandahar, o líder que ele enviou (Gurgin Khan) foi morto. Sob seu líder Mahmud Hotaki, os rebeldes afegãos avançaram para o oeste contra o próprio shah e em 1722 derrotaram uma força na Batalha de Gulnabad e então cercaram a capital, Isfahan.

Depois que o shah não conseguiu escapar ou reunir tropas de outro lugar para socorrê-lo, a cidade foi submetida à fome e o sultão abdicou de seu poder, entregando o poder a Mahmud. Em Khorasan, Nader inicialmente se submeteu ao governante afegão local de Mashhad, Malek Mahmud, mas depois se rebelou e construiu seu próprio pequeno exército.

O filho do sultão Husayn havia se declarado Shah Tahmasp II, mas encontrou pouco apoio e fugiu para a tribo Qajar, que se ofereceu para apoiá-lo. Enquanto isso, os rivais vizinhos imperiais do Irã, os otomanos e os russos, aproveitaram o caos no país para tomar e dividir território para si. Em 1722, a Rússia, governante pelo lendário Pedro, o Grande e auxiliada por alguns dos mais notáveis ​​regentes caucasianos do Império Safávida em processo de ruínas, como Vakhtang VI, deram início à Guerra Russo-Iraniana (1722-1723), em que a Rússia capturou faixas dos territórios do Irã no norte e no sul do Cáucaso, bem como no norte do Irã continental. Isso incluiu, mas não se limitou, às perdas do Daguestão (incluindo sua principal cidade de Derbent), Baku, Gilan, Mazandaran e Astrabad. As regiões a oeste, principalmente territórios iranianos na Geórgia, o território iraniano no Azerbaijão e Armênia, foram tomadas pelos otomanos. As possessões russas e turcas recém-adquiridas foram confirmadas e divididas entre si no Tratado de Constantinopla (1724).

 Durante o caos, Nader fez um acordo com Mahmud Hotaki para governar Kalat no norte do Irã. No entanto, quando Mahmud Hotaki começou a cunhar moedas em seu nome e pediu a fidelidade de todos, Nader recusou.

Tahmasp e o líder Qajar, Fath Ali Khan, contataram Nader e pediram que ele se juntasse à causa e expulsasse os afegãos Ghilzai de Khorasan. Ele concordou e assim se tornou uma figura de grande importância nacional. Quando Nader descobriu que Fath Ali Khan estava trocando correspondências com Malek Mahmud e revelou isso ao shah, Tahmasp o executou e fez de Nader o chefe de seu exército. Nader posteriormente assumiu o título Tahmasp Qoli (Servo de Tahmasp). No final de 1726, Nader recapturou Mashhad.

Algumas versões dessa história narram, contudo, que Fath Ali Khan não era um traidor, sendo as tais cartas forjadas. Alguém forjou uma carta para um chefe curdo, alegando ter vindo de Fath Ali Khan. O suposto Ali Khan teria incitado o chefe a enviar tropas para assassinar o shah e sua família. A carta foi mostrada ao shah, e Fath Ali Khan foi preso, o cegaram e torturam para dizer onde seus objetos de valor estavam escondidos.

Nader poderia muito bem marchar diretamente para Isfahan, mas decidiu primeiramente derrotar os afegãos Abdali, e muitos acabaram se juntando ao seu exército. Já os afegãos Ghilzai contavam com um novo shah, Ashraf Hotak, que decidiu se mover contra Nader, mas em setembro de 1729, Nader o derrotou na Batalha de Damghan e novamente decisivamente em novembro em Murchakhort. Ashraf fugiu e Nader finalmente entrou em Isfahan, entregando-a a Tahmasp em dezembro [2].

Diante de sua conquista, foi concedido a Nader o domínio de várias províncias orientais, até que finalmente em 1738 realizasse o cerco contra Kandahar e acabasse com todo o reduto de poder que ainda restava da dinastia Hotaki. Próximo à Kandahar, Nader construiria uma cidade e a chamaria de Nadebarad, que como pode ser visto, foi nomeada a partir de seu próprio nome [3].

Como vimos, Nader foi galgando nas posições militares até se tornar o comandante de suas próprias tropas e o braço direito dos líderes a quem serviu. Assim, livrou-se dos afegãos na Pérsia em 1729, mas ainda faltava a ameaça principal, que vinha “atrapalhando” os planos persas desde o Império Safávida: os Otomanos, que haviam ocupado a maior parte da porção ocidental da Pérsia, vide o que já foi abordado a respeito da tomada de terras pelos russos e otomanos e que outrora pertenciam aos safávidas.

Como antes de sua campanha contra Herat no ano anterior, Nader parou seus homens ao longo do caminho para uma celebração do Nowruz, o ano novo persa. O objetivo era agradecê-los por seus esforços contra os afegãos e prepará-los mentalmente para a nova campanha contra os turco-otomanos.

O governo otomano não havia respondido formalmente à demanda persa de devolução das terras que os exércitos turcos haviam ocupado. Em Istambul, um enviado persa negociou com o vizir turco, Damad Ebrahim Pasha, não muito afeito à guerra, pela retirada das forças otomanas. Essas negociações podem ter tido algum progresso, mas Nader não esperou pelo resultado e continuou sua marcha para o noroeste. As grandes distâncias e a dificuldade de viajar naqueles dias faziam com que a diplomacia fosse muitas vezes superada pelos acontecimentos. Em Dezful, Nader encontrou na estrada o embaixador que Ashraf havia enviado a Istambul, Mohammad Khan Baluch. O emissário prudentemente deu a Nader as cartas que o sultão otomano escrevera para Ashraf e foi recompensado com o governo de uma província (uma nomeação que Nader se arrependeria mais tarde).

Impaciente para enfrentar o inimigo, Nader marchou para Borujerd e, à noite, para Nahavand, surpreendendo o comandante otomano lá. Confiando em seu sucesso anterior na batalha com os persas, os otomanos partiram para o confronto. Mas os persas de Nader eram tropas de um calibre diferente das que haviam enfrentado anteriormente. Os otomanos foram derrotados após um breve confronto e fugiram para Hamadan,

Depois que os persas tomaram Nahavand, os batedores de Nader o avisaram que um exército otomano de 30.000 homens estava se aproximando. Os dois exércitos se enfrentaram na planície de Malayer, separados por um pequeno riacho. Enfrentando um exército forte em infantaria de arma de fogo, mais semelhante ao seu do que o dos afegãos que ele havia lutado antes, Nader desdobrou suas tropas em uma formação mais flexível de três corpos e reteve o centro, que ele próprio comandava, como reserva. Os otomanos e persas se aproximaram ficando ao alcance dos mosquetes e trocaram tiros por algum tempo através do riacho. Mas então Nader quebrou o impasse ordenando que sua ala direita cruzasse o riacho e atacasse a esquerda otomana. Após uma longa luta, o porta-estandarte otomano foi morto, sua bandeira caiu e as tropas turcas desanimadas recuaram do campo de batalha. Eles tentaram fugir para as montanhas, mas a cavalaria de Nader os perseguiu, matando muitos, capturando alguns altos oficiais otomanos e realizando diversos saques.

Esta batalha acabou com o controle otomano sobre a parte oeste da Pérsia. O governante otomano de Hamadan deixou a cidade e se retirou para Bagdá. Nader conseguiu marchar para Hamadan sem oposição. Ele libertou 10.000 prisioneiros persas e tomou a artilharia e suprimentos que os turcos haviam abandonado em sua fuga. Pouco depois, após mais alguns combates, as tropas de Nader marcharam para Kermanshah e conquistaram toda a província. Nader deu ordens para que novas fortificações fossem construídas em Kermanshah contra futuras invasões otomanas. Ele deixou seus homens descansarem por um mês em Hamadan, mas, impaciente para terminar o trabalho, partiu para o norte em 17 de julho de 1730 para expulsar os otomanos do Azerbaijão e reconquistar Tabriz.

Afrontado pelos ataques de Nader às suas forças, o governo otomano em Istambul declarou formalmente guerra e prendeu o embaixador persa, mas mesmo assim continuaram, por meio de um enviado especial a Isfahan e seu governante em Bagdá, a pressionar Tahmasp para um acordo de paz. O sultão Ahmad e seu vizir Damad Ebrahim ainda aguardavam um tratado com os persas que lhes permitisse manter a Geórgia, Shirvan e Yerevan, mas estavam preocupados com a agitação em Istambul, onde o povo estava cada vez mais irritado com os rumores de derrota no leste.

Indiferente às discussões que aconteciam em outros lugares, que suas ações tendiam a tornar irrelevantes, Nader marchou para o norte via Sanandaj e se deparou com outro exército otomano em Miyandoab, ao sul do lago Urmiye. À medida que os persas se aproximavam, os turcos se organizaram em formação de batalha, mas as notícias das vitórias anteriores de Nader devem ter abalado sua confiança. Quando os persas avançaram e a poeira dos cascos dos cavalos persas soprou em seus rostos, cegando-os, os soldados otomanos fugiram antes que os persas fizessem contato. Nader continuou seu avanço para o norte. O motim estava surgindo entre os otomanos desmoralizados. Após alguns confrontos menores, os homens de Nader derrotaram Mostafa Pasha, o governador otomano de Tabriz, perto de Soheylan. Após cada uma dessas batalhas, os persas mataram muitos dos otomanos em fuga, capturaram muita artilharia e saques e também fizeram muitos prisioneiros. Depois de Soheylan, muitas das mulheres otomanas também caíram em suas mãos, “belas como as huris do paraíso”. Seguindo sua prática habitual em relação às mulheres, Nader deu ordens para que fossem escoltadas em segurança para casa, proibindo severamente que qualquer pessoa pusesse as mãos nelas.

As relações entre Nader e o shah Tahmasp haviam declinado quando este ficou com inveja dos sucessos militares de seu general. A partida de Nader para Khorasan no verão de 1730 deu ao Shah Tahmasp sua grande chance de alavancar sua reputação. Na ausência de seu general, Tahmasp poderia tentar aumentar seu prestígio pessoal e estabelecer-se como digno de seu trono por seus próprios méritos. Mas, embora alguns de seus cortesãos o exortassem a fazê-lo por meio de uma nova campanha contra os otomanos ao noroeste para recuperar Yerevan e Geórgia como Nader havia planejado, Tahmasp passou cinco meses bebendo e se divertindo em Isfahan, demonstrando pouco ou nenhum sinal de urgência e preocupação com os conselhos que recebera.

Enquanto isso, os otomanos se recuperavam lentamente do período de caos que se seguiu à revolta de setembro de 1730 e à deposição do sultão Ahmed. Quando Tahmasp finalmente deixou Isfahan para Tabriz em janeiro de 1731, o novo sultão otomano, Mahmud, estava pronto para ele. Em Tabriz, Tahmasp substituiu o governador que Nader havia nomeado por um de seus próprios partidários e partiu para o noroeste com 18.000 homens. Aproximando-se de Yerevan, seu exército encontrou uma força de turcos otomanos e os derrotou após um curto combate. Os otomanos recuaram para Yerevan, e os homens do de Tahmasp se estabeleceram para cercar a cidade. Mas esse sucesso inicial não durou muito. Tahmasp avançou precipitadamente, sem considerar o perigo das forças inimigas em seus flancos. Outras tropas otomanas, operando ao sul de Yerevan, conseguiram interromper o fluxo de suprimentos para o exército de Tahmasp e, após apenas dezoito dias, ele foi forçado a se retirar novamente para Tabriz. Enquanto estava lá, ele ouviu que o governador otomano de Bagdá, Ahmad Pasha, havia invadido o território persa, indo para Kermanshah e Hamadan. Tahmasp correu para o sul para enfrentar a nova ameaça, deixando Tabriz exposta às forças otomanas, que recuperaram a coragem e avançaram novamente de Yerevan.

Quando Tahmasp chegou perto de Hamadan, Ahmad Pasha havia ocupado Kermanshah. Tahmasp parou em Kurijan, nordeste de Hamadan, e o exército otomano avançou para encontrá-lo. Ahmad Pasha enviou mensageiros com propostas de paz, e Tahmasp respondeu, mas a essa altura os dois exércitos estavam muito próximos, ao alcance de um tiro de canhão. Os persas se organizaram em três corpos, com cavalaria nas laterais e infantaria de mosquetes no centro. Enquanto os mosqueteiros persas eram principalmente novos recrutas (os veteranos estavam com Nader), a infantaria otomana era composta de janízaros experientes.

Temendo que os otomanos estivessem prestes a fazer um ataque surpresa, apesar das negociações de paz, Tahmasp ordenou que seu canhão disparasse e logo a batalha se generalizou. A cavalaria persa superou a cavalaria otomana e atacou três vezes. Mas os janízaros avançaram lentamente apesar dos cavaleiros persas e abriram fogo contra os mosqueteiros persas, que fugiram quase imediatamente. Então os janízaros se voltaram contra a cavalaria persa. Em pouco tempo o próprio Tahmasp estava quase cercado. Ele conseguiu escapar, mas agora os persas estavam irremediavelmente derrotados. Aqueles da infantaria que não foram mortos foram cercados pelos otomanos e acorrentados, e a maioria dos restantes sobreviventes, desmoralizados, foram direto para casa.

Poucas semanas depois da desastrosa derrota de Tahmasp na batalha de Kurijan, os otomanos ocuparam Hamadan, Tabriz e todos os outros territórios que os persas haviam tomado deles em 1730, acabando com todos os sucessos de Nader. Ansiosos para aproveitar a vantagem que haviam adquirido com os erros do shah, os enviados otomanos pressionaram por um acordo de paz. Eles estavam preparados para evacuar Kermanshah, Hamadan e Tabriz, em troca da confirmação de sua posse da Geórgia, Armênia e outros territórios ao norte do rio Araxes. Em janeiro de 1732, Tahmasp concordou com um tratado com os otomanos nesses termos.

Uma cópia do tratado de Tahmasp com os turcos otomanos alcançaria Nader em seu caminho de Herat para Farah. Ele podia até querer seguir seu caminho contra Herat marchando em Kandahar, mas agora esses planos tinham que esperar. Em 1732, ele forçou Tahmasp a abdicar em favor de seu filho ainda bebê, Abbas III, a quem Nader se tornou regente.

Nader decidiu que poderia reconquistar o território na Armênia e na Geórgia tomando a Bagdá otomana e oferecendo-a em troca das províncias perdidas, mas seu plano deu errado quando seu exército foi derrotado pelo general otomano Topal Osman Pasha perto da cidade em 1733. Esta foi a única vez que ele foi derrotado em batalha, mas Nader decidiu que precisava recuperar o controle o mais rápido possível para salvar sua posição porque as revoltas já estavam eclodindo no Irã. Ele enfrentou Topal novamente com uma força maior, dessa vez o derrotando e o matando. Ele então sitiou Bagdá, assim como Ganja nas províncias do norte, conseguindo uma aliança russa contra os otomanos. Nader obteve uma grande vitória sobre uma força otomana superior em Baghavard e, no verão de 1735, a Armênia iraniana e a Geórgia eram suas novamente. Em março de 1735, ele assinou um tratado com os russos em Ganja pelo qual estes concordaram em retirar todas as suas tropas do território iraniano, aquelas que ainda não haviam sido cedidas pelo Tratado de Resht de 1732, resultando no restabelecimento do domínio iraniano sobre todo o Cáucaso e o norte do Irã continental novamente.

Embora fosse regente do pequeno shah Abbas, não foi do dia para a noite que Nader se tornou o novo governante de direito da Pérsia. Primeiramente, o mesmo precisou fazer uma série de acordos e também acalmar os ânimos da população, ainda muito afeitos ao antigo Império Safávida. Após todos esses preparativos, Nader finalmente se tornou o shah em 8 de março de 1736.

Dentre os acordos realizados por Nader antes de se tornar o novo shah da Pérsia, um deles consistia em uma maior aproximação com os muçulmanos sunitas do país. A vertente xiita do Islã era a religião oficial do Império Safávida, e é provável que o próprio Nader tenha sido educado dentro do xiismo, porém conforme os anos se passaram, o mesmo se converteria ao Islã sunita, provavelmente com certa influência otomana.

Ele acreditava que o xiismo safávida havia intensificado o conflito com o Império Otomano sunita. Seu exército era uma mistura de muçulmanos xiitas e sunitas, com uma notável minoria de cristãos e curdos, e incluía uzbeques, afegãos, cristãos georgianos e armênios, dentre outros. Ele queria que o Irã adotasse uma forma de religião que fosse mais aceitável para os muçulmanos sunitas e sugeriu que o Irã adotasse uma vertente de xiismo que ele chamou de “Jafari", em homenagem ao sexto imam xiita Jafar al- Sadiq. Ele proibiu certas práticas xiitas que eram particularmente ofensivas aos muçulmanos sunitas, como amaldiçoar publicamente os três primeiros califas do Islã.

Ao que as fontes indicam, as políticas religiosas de Nader possuíam mais um cunho diplomático e pacificador do que motivação piedosa. O Shah tinha como médico pessoal um jesuíta francês, que relatou que era difícil saber qual religião ele seguia e que muitos que o conheciam melhor diziam que ele não tinha nenhuma.

Como mencionado, em 1738 Nader havia conquistado Kandahar, colocando um fim na dinastia Hotaki. Após isso, o mesmo decidiu ir em direção ao Império Mogol.

Este outrora poderoso estado muçulmano da Índia estava desmoronando à medida que os nobres se tornavam cada vez mais desobedientes e os oponentes locais, como os sikhs e os maratas hindus do Império Maratha, se expandiam em seu território. Nader usou o pretexto de seus inimigos afegãos se refugiarem na Índia para cruzar a fronteira e invadir o império militarmente fraco, mas ainda extremamente rico. Ao derrotar o governante de Peshawar, no atual Paquistão, isso levou à captura de Ghazni, Cabul, Peshawar, Sindh e Lahore.

As notícias dos sucessos rápidos e decisivos do exército iraniano contra os estados vassalos do norte do império Mughal causaram muita consternação em Deli, levando o sultão Mogol, Muhammad Shah, a reunir um exército de cerca de 300.000 homens e marchar para enfrentar Nader Shah.

Embora com uma desvantagem imensa de 6 para 1, Nader Shah esmagou o exército mogol em menos de três horas na enorme Batalha de Karnal em 13 de fevereiro de 1739. Após esta vitória espetacular, Nader capturou Muhammad Shah e entrou em Deli. Quando surgiu um boato de que Nader havia sido assassinado, alguns dos indianos atacaram e mataram tropas iranianas. Nader, furioso, reagiu ordenando que seus soldados saqueassem a cidade. Durante o curso de um dia (22 de março), 20.000 a 30.000 indianos foram mortos pelas tropas iranianas e cerca de 10.000 mulheres e crianças foram levados como escravos, forçando o sultão mogol a implorar a Nader por misericórdia. O preço a se pagar pela misericórdia do Shah persa, contudo, não foi barato: Muhammad Shah precisou entregar todo o seu tesouro, inclusive o famoso Trono do Pavão, símbolo característico dos mogois desde o século XVII ao ter sido encomendado por Shah Jahan [4]. Não somente, mas Nader Shah tomou mais uma série de bens lendários e milionários da coroa mogol, estimando o tesouro em cerca de 700 milhões de rúpias. O tesouro foi transportado através de 700 elefantes, 4.000 camelos e 12.000 cavalos. A pilhagem tomada da Índia foi tanta que Nader parou de cobrar impostos no Irã por um período de três anos após seu retorno.

Os ataques ao Império Otomano e principalmente seu saque contra o Império Mogol marcaram o auge do reinado de Nader Shah. Não seriam, porém, suas últimas campanhas militares: Nader ainda viria a guerrear na Ásia Central, Arábia e novamente com o próprio Império Otomano, mas sem os habituais sucessos de seu passado.

À medida que o mesmo foi envelhecendo e adoecendo, sua riqueza também iria diminuindo, e o governante se tornaria cada vez mais despótico com o intuito de pagar suas campanhas militares. Novas revoltas eclodiram e Nader as esmagou impiedosamente, construindo torres com os crânios de suas vítimas, tão qual seu herói Timur havia feito antes dele.

Conforme sua tirania foi crescendo, alguns de seus oficiais e cortesãos temiam que ele estivesse prestes a executá-los e conspiraram contra ele, incluindo dois de seus parentes: Muhammad Quli Khan, o capitão dos guardas, e Salah Khan, o supervisor da casa de Nader. Nader Shah foi assassinado em 20 de junho de 1747 em Quchan, Khorasan. Ele foi surpreendido enquanto dormia por cerca de quinze homens e esfaqueado até a morte. Nader foi capaz de matar dois dos assassinos antes de morrer.

NOTAS

[1] A data de seu nascimento é incerta, alguns especulam ter sido em 6 de agosto de 1698, outros afirmam ter sido em 22 de novembro de 1688, um lapso temporal de 10 anos.

[2] Ao escapar da Pérsia, Ashraf foi capturado e assassinado pelo khan de Kalat, Mir Mohabbat Khan Baloch em 1730.

[3] Essa cidade foi abandonada após a morte de Nader Shah ainda no século XVIII, mas continuava a aparecer em mapas europeus do século XIX.

[4] O trono levado por Nader Shah como espólio de guerra desapareceria posteriormente para nunca mais ser visto. Foi encomendado uma réplica do mesmo, mas que perduraria só até a Revolta Indiana de 1857.

REFERÊNCIAS

AMMANAT, Abbas. Iran: A Modern History. Yale University Press, 2017.

AVERY, Peter G.; HAMBLY, G.R.G.; MELVILLE, C. The Cambridge History of Iran: From Nadir Shah to the Islamic Republic. Vol.7. Cambridge University Press, 1991.

AXWORTHY, Michael. The Sword of Persia: Nader Shah, from tribal warrior to conquering tyrant. I.B. Tauris, 2006.

KARAHASANOGLU, Selim. The 1730 Rebellion. History of Istanbul, 2019.